Com avanço de 0,8% no terceiro trimestre contra os três meses anteriores, com ajuste sazonal, o PIB da indústria total surpreendeu positivamente. O crescimento, porém, foi puxado pela construção, que avançou 1,1% na mesma comparação. Sob impacto de alta de juros, deslocamento do consumo para serviços e desaceleração da economia global a indústria da transformação ficou praticamente estável, com alta de apenas 0,1%.
Também sob efeito da demanda externa, a indústria extrativa recuou 0,1%. Quarto segmento que compõe a indústria no PIB, a produção e distribuição de energia, gás e água cresceu 0,6%. Economistas esperam que o efeito da política monetária apertada e do cenário global desfavorável se dissemine mais entre os segmentos industriais no último trimestre do ano.
Apesar da boa surpresa da indústria total no PIB, a leitura mais detalhada e análise da perspectiva do setor para os próximos trimestre são menos positivas, aponta o economista do banco Original Eduardo Vilarim. O bom desempenho da construção, diz, tem se destacado nas últimas divulgações. A indústria extrativa, explica, foi afetada pela produção de minério de ferro, principalmente, que está relacionada com a desaceleração global e alguns impactos da cadeia de produção que se mantêm.
A indústria extrativa, diz o economista, deve continuar sob impacto negativo com a continuidade da política de “covid zero” da China. Os severos lockdowns no país asiático, explica, afetam a demanda local e repercutem nas exportações brasileiras.
A demanda externa também tem afetado a indústria de transformação, destaca Sergio Vale, economista da MB Associados. O setor automobilístico, exemplifica, vem perdendo mercado externo com a crise da Argentina. A partir do quarto trimestre, diz, a perspectiva é de maior desaceleração da economia global, não apenas da China, mas também com quadro mais nebuloso para EUA e Europa.
“E a indústria de transformação não tem jeito, está em desaceleração após os melhores momentos propiciados ao setor pela pandemia, quando a população estava consumindo mais bens do que serviços”, diz Vale. Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), lembra que esse consumo maior de bens que beneficiou a indústria durante a crise sanitária se deslocou para serviços após a retomada da mobilidade.
Para Cagnin, outro fenômeno que afeta a indústria neste momento é o início da normalização dos gargalos logísticos resultantes da pandemia. No momento em que essas dificuldades estavam maiores, explica, fornecedores de bens intermediários nacionais foram demandados no lugar dos importadores para suprir as cadeias produtivas. Agora, com fluxo logístico mais organizado, essa demanda tende a se voltar novamente para as importações.
A indústria, diz o economista-chefe da Azimut e professor do Insper, Gino Olivares, ainda tenta superar uma longa tendência de estagnação observada na série histórica desde 2014. “A indústria está um pouco acima do que estava no quarto trimestre de 2019, antes da pandemia, mas quando se olha atentamente se vê uma história de estagnação de 2014 adiante. Há alguns sinais de que começa a crescer, mas o setor vai sentir mais a taxa de juros alta agora.”
Fonte: Valor Econômico